sexta-feira, 2 de julho de 2010

História de um trabalhador

Hoje parei para observar os peixes que ficam em uma fonte próxima ao prédio dos Correios. É tão raro eu parar para ver alguma coisa. Sou trabalhador. Assim como milhões de pessoas. Não tenho tempo para observar nada. Mas hoje resolvi olhar as coisas ao meu redor. Tenho certeza que vou levar uma bronca do patrão... Isso, se não perder o emprego. Mas hoje não quero trabalhar. Nem lembro qual foi a última vez em que fiquei um dia sem fazer nada. Acordei pensando se vale a pena trabalhar tanto. Não estou conseguindo realizar meus sonhos. Ainda não comprei minha casinha, nem meu carro velho. Não vejo meus pais há quinze anos. Não pude ver meu irmão antes que o coitado morresse. Não sei mais quantos sobrinhos tenho.

Só sei que meus filhos precisam de mim, apesar de nem sempre eu poder ajudar. Nem sempre estou com eles na hora em que necessitam de carinho e atenção. Nem sempre. Qual será o motivo que me faz seguir em frente? Tem horas que sinto tanta saudade da minha família... Sei que deveria passar mais tempo com eles, mas as contas não deixam. É o aluguel, as compras do mês, o material escolar dos meninos, remédio do mais novo, empréstimo com agiota. Se eu não tivesse sido assaltado mês retrasado não precisaria ter pego dinheiro com aquele agiota. Por que será que existem pessoas tão ruins no mundo. Trabalho tanto... Preciso tanto daquele ordenado que chega de forma tão suada! Dizem que é culpa do governo, da sociedade, de não sei mais quem. Mas não acho que a solução seja roubar o pouco que as pessoas têm. É preciso lutar sempre. Acho que esta é a melhor solução.

Eu, por exemplo, voltei a estudar. Saio do serviço e vou direto para a escola. Só não sei o que está sendo mais difícil: a saudade da família, o cansaço ou a dificuldade para aprender tantas coisas novas. E eu que achava que não havia mais nada nesta vida para aprender! Mas uma coisa eu tenho que confessar: como é gostoso se sentir capaz, inteligente, guerreiro. O melhor de tudo é a esperança que voltar à escola me resgatou. Sem contar que agora sei que não sou apenas mais um no meio dessa gente toda. Tenho alma, tenho vontade. Aí me lembro da força que me faz seguir, que me faz ter esperança, coragem para trabalhar mesmo enxergando os sonhos tão distantes. É a fé. Lembro também dos meus filhos, minha mulher, meu futuro e me vem na cabeça a frase de um tal de Albino Teixeira, dita por meu professor: “A morte do homem começa no instante em que ele desiste de aprender”. Vejo então que é preciso aprender sempre. É preciso lutar sempre. E chego a conclusão que vale a pena sim. Olho para o relógio e decido que ainda dá tempo de chegar ao trabalho. Chegou a hora de continuar a batalha.

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